No dia 26 de Maio,
comemorou-se cinquenta anos do primeiro transplante de coração feito no Brasil.
Em 1968, Euryclides de Jesus Zerbini,
cirurgião do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (HC-USP),
revolucionou a medicina ao liderar o primeiro transplante de coração do Brasil
– embora não tenha sido o pioneiro, está entre os cinco primeiros do mundo
(África do Sul, EUA, França e Inglaterra saíram na frente). O receptor do
coração foi João Ferreira da Cunha, que ficou conhecido como João Boiadeiro,
mato-grossense de 23 anos que sofria de insuficiência cardíaca e doença do
miocárdio.
A cirurgia foi um
sucesso, o que mostrou a grande capacidade da equipe de cirurgia torácica do
Hospital das Clinicas. Infelizmente, o pós-operatório mostrou-se preocupante.
Na época, sem muitas informações e técnicas, o corpo de João Boiadeiro começou a mostrar sinais de
rejeição e com 28 dias veio a falecer. Mesmo com a técnica cirúrgica já
apurada, ainda faltavam recursos farmacológicos para combater a rejeição ao
órgão pelo novo organismo. Passada a euforia inicial, houve um desencanto
diante dos resultados negativos. Foram 100 transplantes em 1968 em todo o
mundo, 50 em 1969, 20 em 1970 e 10 em 1971. A rejeição do órgão no pós-operatório
parecia incorrigível, mas o cenário mudou com o surgimento da ciclosporina.
Hoje, a técnica já é
bem mais apurada. Um coração pode vir de longe – antes, fazia transplante com
corações que estavam perto do receptor - e 51 minutos depois já bate no novo peito,
além de ter uma técnica mais arrojada que permite menos complicações. Cerca de
400 pessoas recebem por ano um novo coração no país. O número ainda reduzido
tem a ver com a falta de doadores. A legislação brasileira permite a doação
mediante autorização familiar, mesmo que em vida o paciente tenha informado a
família o interesse em se tornar doador com documentação que prove este desejo,
a família ainda pode recusar.
Entre 40% e 50% das
possíveis doações de órgãos são negadas pela família por razões que vão da
dificuldade em aceitar a perda de um ente querido a questões religiosas. Muitas
vezes há dificuldade em explicar para a família o conceito de morte cerebral
–quando a pessoa não tem mais chances de voltar a interagir com o mundo, mas
seus outros órgãos continuam funcionando. O tema é considerado um tabu, poucos
gostam de falar sobre morte quando estão juntos com a família. Surgiu então a campanha,
doe órgãos, salve vidas, que tem a finalidade de aumentar o número de doadores
no Brasil através de palestras e eventos.
Muitas vezes, o transplante de órgãos pode ser única
esperança de vida ou a oportunidade de um recomeço para pessoas que precisam de
doação. O Sistema Único de Saúde (SUS) tem o maior programa público de
transplante do mundo, no
qual cerca de 87% dos transplantes de órgãos são feitos com
recursos públicos, e ajuda cada vez mais pessoas a terem uma vida melhor.
É normal, comum até,
ter medo da morte e não querer se preocupar com esse assunto ainda em vida.
Muito mais cômodo é não pensar a respeito, apesar da inevitabilidade de que, um
dia, todo mundo parte. Mas há uma decisão que, se tomada por uma só pessoa
durante a vida, pode ajudar a salvar ou, ao menos, melhorar a saúde de outras
dezenas. Não é toda morte que pode resultar em doação de órgãos: somente quando
o cérebro deixa de funcionar e o coração continua batendo com a ajuda de
aparelhos – na chamada morte encefálica – é que os órgãos poderão ser
transplantados para outra pessoa. Isso ocorre, por exemplo, com vítimas de
traumatismo craniano (por acidente ou violência) ou acidente vascular cerebral
(AVC). Já no caso dos tecidos, é diferente: mesmo após a parada cardíaca, é possível
doar córneas, pele e ossos, entre outros. Por isso, fale sobre o assunto, se
informe e ajude a salvar vidas.
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